ARTE NO CAMPUS

Aspectos da coleção de obras de arte pública da Universidade Estadual de Campinas

Sylvia Furegatti

2003

Monografia final da Disciplina

MUSEUS: UMA NOVA ABORDAGEM / FAU – USP

sob a orientação dos profs.  Drs.

Maria Cecília França Lourenço e Agnaldo Farias

para obtenção de nota de aproveitamento

em disciplina do programa de doutorado da FAU – USP.

Resumo

O estudo aqui apresentado foi produzido como um ensaio preliminar à pesquisa de doutorado que estou desenvolvendo sobre as bases de formação da Arte Pública e Urbana no Brasil. Sob a orientação do prof. Dr. Luis Munari desenvolvo uma análise sobre os procedimentos estéticos e projetivos praticados por um grupo selecionado de artistas ligados à essa produção tridimensional praticada no Brasil nas últimas três décadas.

Por ora, foco minha investigação na formação do conjunto que podemos apreender como a coleção escultórica e de intervenção artística do campus da Universidade Estadual de Campinas desde sua formação.

Esta pesquisa colabora em muito com o meu plano de estudo por propiciar a análise dos elementos estéticos e corporativos presentes no caso específico desse conjunto da Unicamp.

Assim, os conceitos a serem aplicados à coleção da Unicamp buscam identificar as relações de incentivo criativo e curatorial presentes em sua constituição pontuando com isso alguns questionamentos sobre as relações geradas por esse histórico de criação e os paradigmas aceitos e consagrados de outros modelos de coleções. Interpõe-se aqui o levantamento das peças desse conjunto e a relação de aproximação entre os projetos artísticos e o espaço ocupado no campus.

Como a Unicamp ainda não dispõe de um material que aborde esse patrimônio como tal foi necessário recorrer a um levantamento documental administrativo seguido da localização de material crítico textual, dos próprios projetos encaminhados pelos artistas aos diversos departamentos envolvidos com as doações e criações das peças bem como fazer o levantamento dos registros fotográficos da época de suas implantações além de entrevistas com os artistas, antigos professores e funcionários ligados à história de implantação dessas peças no campus.

Os registros visuais das peças presentes foram atualizados com nova tomada fotográfica. Fotografias antigas da paisagem do campus e dos momentos de instalação das peças nos permitem averiguar o desenvolvimento desses espaços bem como analisar o histórico das peças.

“Nunca foi fácil para o museu preservar ou manter um grau satisfatório

de mobilidade e integridade intelectual.

É necessário astúcia, determinação –  e um pouco de sorte.

Mas uma sociedade democrática exige nada menos do que isso.”

Hans Haacke

Museu: administrador de consciências (1986)

Introdução A identidade das coleções universitárias

A vocação dos campi universitários para o incremento cultural é prática conhecida da maioria das antigas universidades federais, estaduais e mesmo particulares implantadas nacional e internacionalmente cujo histórico de existência compreenda pelo menos 30 ou 40 anos.

De modo geral, a especificidade formativa e pedagógica admitida para todo e qualquer trabalho desenvolvido dentro das universidades faz com que esses organismos sejam entendidos pela sociedade como celeiros naturais de parques escultóricos, como promotores de espaços para discussões, congressos, debates e estudos da cultura.

No meio urbano são também conhecidos programas governamentais estrangeiros e algumas iniciativas nacionais que impulsionam, principalmente ao longo dos anos 80, a produção de peças artísticas tridimensionais em espaços públicos com a intenção de valorizar esses espaços de convívio, lazer, comércio e negócios além do esperado acréscimo cultural para seus usuários. [1]

Esses dois universos se entrelaçam: os campi universitários nos remetem à diversidade típica de um centro urbano, onde é possível encontrar todo tipo de manifestação. Inclui-se aí, quase linearmente, a escultura como valor visual desse contexto, quer seja, pela noção de embelezamento que empresta à paisagem, quer seja, pela sua pontuação como marco histórico desse organismo social, quer seja, pela condição de experiência estética ressemantizadora decorrente de suas disciplinas de estudo mais específicas.

Na sua configuração espacial, o campus universitário é formado, normalmente, por múltiplos acessos; jardins geralmente no padrão de esplanada; múltiplas praças; núcleos de convívio coletivos e teatros de arena intercalados por conjuntos de prédios formais. Nessa configuração tão próxima a de um centro urbano pode estar parte significativa da chave que funde arte pública e universidade.

Uma primeira análise da investida escultórica e pública por sobre os campi universitários demonstra que a ocupação de seu espaço aberto por obras de arte reflete a possibilidade de humanização desses territórios por meio da aplicação de elementos simbólicos que trabalham para transformar a imparcialidade daquilo que até então é espaço  e passa à condição de lugar.

No Brasil são relativamente poucos os campi de universidades públicas ou particulares que possuem um acervo a céu aberto. De modo particular, a USP detém um importante parque escultórico resultado da conjunção de formação dos seus diversos museus.[2] Outras instituições importantes do país como, por exemplo, a Universidade Federal de Brasília, a Universidade Federal do Rio de Janeiro ou a Universidade Federal do Rio Grande do Sul também dispõem de monumentos e obras escultóricas em seus campi. Assim também a Unicamp dispõe de uma coleção de peças escultóricas criada como resposta a essa citada vocação. A construção desse acervo está, de modo geral, atrelada à presença nas universidades de um instituto ou departamento de Artes. Mas, infelizmente não é consenso encontrar em toda universidade uma coleção de obras públicas permanentes, com a prática de sua exposição, estudo e divulgação do acervo como patrimônio.

As dificuldades de manutenção e exposição inerentes à escultura, em especial aquela de modelo público e a predileção por acervos mais flexíveis e itinerantes como os de pintura e demais técnicas bidimensionais acaba respondendo pelo interesse da maioria das universidades e museus nela implantados.

Diante das discussões travadas na atualidade que revelam o enxugamento dos modelos acadêmicos sem a correspondência de aplicações práticas mercadológicas, observa-se a diminuta atenção dispensada para departamentos e cadeiras voltadas à discussão exclusivamente teórica ou de fundamentação artística independente dos eixos da industria cultural mais bem aceita ou absorvida pela sociedade.

Com isso o sentido das coleções artísticas construídas nos espaços universitários sofre também um sensível recolhimento. Recolhimento que não nos serve como explicativo único de seu sucesso. Esse sinal parece mais revelador se observado por outro ângulo do contexto que vê as novas formas de sobrevivência dessas áreas de conhecimento cultural e artístico e dentro delas os novos formatos das coleções.

O olhar que se pretende fazer sobre essas coleções ocupa-se mais do sentido do processo de implantação das peças escultóricas e ressemantização dos espaços de convívio e cidadania na universidade que propriamente reitera o conceito desses organismos como abrigo de objetos raros.

Deste modo a leitura que se faz das coleções atuais nessa pesquisa busca discutir o elemento da disparidade dos valores admitidos para seus semióforos uma vez que as mudanças nas relações entre a arte e o cotidiano propõem a crise do antigo modelo identificado de coleção sugerindo a necessidade de outras leituras para a compreensão de seu atual contexto. [3]

O desvio sentido na criação artística, principalmente a escultórica, na passagem da modernidade para a pós-modernidade assiste ao escape dos bem preparados espaços musealizados para os espaços abertos do meio urbano provocando com isso uma mudança de conduta que facilita a disseminação dos resultados artísticos cada vez mais fluídos e efêmeros representados finalmente apenas pelos registros áudio-visuais que garantem, tempos depois, a sua memória e existência.

É preciso pensar, portanto que essa mudança na conduta dos artistas quanto à eleição dos materiais ou mesmo do sentido perene das suas obras torna a memória das ações e atividades artísticas parte significativa do modelo de coleção que se faz presente nas instituições atuais. Essas coleções parecem criar novos heteróclitos para nossa compreensão desafiando o modo de compreensão do trabalho exercido dentro dos departamentos de conservação dos museus, dos conselhos ou comissões que aprovam a viabilização ou aquisição de novos projetos artísticos pautados por valores contemporâneos da efemeridade.

O valor de troca destituído do valor de uso, descrito por Pomian, configura-se ao longo do século XX sugerindo novas maneiras de se pensar o paradigma da coleção[4], em especial, a de arte. Contudo, acostumados aos movimentos mais aparentes para definir física e materialmente o que é a coleção de arte, como deve e pode ser estudada, atribuímos importância e atenção para modelos de coleções que signifiquem principalmente a conjunção bem guardada de obras materiais, esteticamente irrefutáveis, fisicamente palpáveis que confirmam a sorte e o poder de seu detentor.

A coleção da Unicamp poderia ser facilmente descartada por esses critérios, mas vale, já de início, por representar a investida do grupo de artistas, docentes, convidados ou comunidade sobre aquele espaço em formação do campus universitário como apresentam os próximos capítulos.

A própria limitação das verbas destinadas às aquisições de obras mais raras e sofisticadas evitadas por serem dispendiosas demais criam os hiatos e distanciamentos do qual tanto se fala diante do conjunto de peças de qualquer coleção. Essa condição bastante igualada nas universidades e museus nacionais nos permite reconsiderar os méritos do objeto dessa pesquisa.

Apesar de sua anunciada fragilidade percebe-se que, diante das qualificações essenciais descritas por Pomian em seu modelo de coleção, o conjunto de obras escultóricas da Unicamp revela o cumprimento de quase todos os dispositivos necessários ao seu reconhecimento: constrói-se, com as peças lá presentes, um núcleo de semióforos organizados e mantidos pela universidade que os reconhece como objetos artísticos do campus retirados do circuito das atividades econômicas correntes.

Suas peças podem ser entendidas como pertencentes à Unicamp por disporem de seu espaço físico limite apresentando-o, interagindo com sua história, fazendo assim com que, sejam salvaguardadas e mantidas pelas regras de conduta e acesso da própria instituição. A sua instalação nos diferentes espaços do campus propõe modelos de apresentação para esses trabalhos por meio de legendas (limitadas, contudo, a apenas parte das peças), por meio da escolha de lugares abertos com acesso visual e físico possível para qualquer visitante ou freqüentador interessado.[5]

A questão mais importante que se propõe para essa coleção tridimensional ocorre, contudo na sua compreensão como tal. É nesse critério que se encontra parte importante do problema de sua relação com o público local, com a manutenção e cuidados de cada obra, de sua inteligibilidade e pertencimento. No levantamento bibliográfico e nas entrevistas feitas sempre aparecem dois pontos: a chave desconhecimento/ esquecimento e, imediatamente colado a ela, o outro ponto, de reiterada consideração por seu mérito como patrimônio.

A dicotomia está constituída: o mesmo organismo fomentador da novidade e da renovação das pesquisas e linguagens artísticas é ainda o seu mais indiferente interlocutor. Nessa direção percebemos que a falta de compreensão desse conjunto da Unicamp como uma coleção parece fazer parte da crise de tratamento e apresentação resultada da conjunção Arte e Instituição quebrando assim o pressuposto de problema localizado.

Essa dificuldade de entendimento das coleções, das partes que formam o seu conjunto sofisticado de relações entre o visível e o invisível, analisado por Pomian, pode ser verificado em diferentes instituições e passagens da História da Arte.

Um referencial importante que pontua essa discussão pode ser visto no estudo desenvolvido por Cristina Freire junto à coleção de obras conceituais do acervo do MAC USP. Em seu livro Poéticas do Processo – Arte conceitual no museu a autora apresenta seu interesse pelo que chama de destino errático de algumas peças como livros de artista ou vídeos, arte postal, fotografias, cartazes ou panfletos que desafiam durante décadas os procedimentos e formatos adotados para o tombamento, restauro, manutenção e exposição admitidos e praticados por esse museu universitário.[6]

Estendendo sua leitura para toda e qualquer instituição que trabalhe com diferentes produtos da arte atual, Cristina Freire analisa as dificuldades enfrentadas pelos organismos perante seus acervos. A alteração não meramente semântica, mas de ordem epistemológica verificada pela autora quanto ao conceito de obra de arte e sua forma de apresentação e memória nos serve como analogia para se pensar sobre possíveis novos programas das coleções criadas em nossa atualidade e em particular, a coleção da Unicamp.

Assim, investigar a formação e os problemas decorrentes do conceito de coleção a partir dos exemplares escultóricos e de intervenção formados por esse acervo da Unicamp parece indicar um modo de observação mais curiosa sobre seu conjunto.

Capítulo 1 Das Intenções Iniciais.

A primeira investida escultórica no Campus da Unicamp

Sob a administração de Aristodemo Pinotti como reitor é que o campus da Universidade Estadual de Campinas passa a contar com um empenho na constituição de obras escultóricas públicas. Presente à frente da Reitoria no período de 1982 a 1986 Pintotti tem constantes estímulos para a arte também motivados pela atuação de Suely Pinotti, sua esposa e professora do Instituto de Artes.

O histórico do Instituto de Artes tem início ainda na década de 70 com a atuação do Departamento de Música. As atividades ligadas às artes visuais têm início algum tempo depois, de forma algo experimental. Os cursos funcionavam em espaços improvisados, chamados de barracões, já que o prédio oficial do Instituto de Artes ainda não havia sido construído. Contudo, é a partir dessa experiência inicial é que se configura o Departamento de Artes Plásticas, efetivamente implantado em 1983 sob a tutela de Pinotti como reitor.

Já em 1985, contando com um grupo atuante de artistas como corpo docente, o IA vai promover a proposta de ocupação dos espaços abertos da universidade com obras criadas por seus artistas. Parte de Suely Pinotti a idéia inicial para o projeto que se intitula Artes no Campus. A partir dos contatos estabelecidos por ela junto à reitoria é que se esquematiza uma ação dentre os professores. Em uma circular datada de 28 de maio de 1985 o então chefe de departamento Bernardo Caro, cita o entusiasmo da recepção do projeto para se criar “painéis, esculturas, objetos, etc” [7] que ocupassem o campus e convida todos os professores interessados na proposta a encaminharem seus projetos. Uma comissão formada pelos professores Carlos Vogt, Omar Marquese, Ubiratan D’Ambrosio e Almeida Prado selecionou os trabalhos inscritos por professores de todos os departamentos do IA, convidados a integrar o projeto. [8]

Por meio dessa iniciativa se estabelece o grupo inicial de esculturas criadas entre os anos de 1985 e 1989 de autoria dos artistas-professores Suely Pinotti; Fulvia Gonçalves; Berenice Toledo; Marco do Valle; Gastão Manoel Henrique e Akiko Fujita. Junto desse grupo participa também o responsável pelo depto gráfico José Gerônimo Noboru Ohnuma.

A vocação estética do grupo que se apresenta dividia-se entre a orientação bidimensional e tridimensional. Os três representantes da área tridimensional são: Marco do Valle e Gastão Manoel Henrique e Akiko Fujita e todos os demais se ligavam à produção bidimensional. Apesar dessa divisão, o que se percebe é um certo afinamento do grupo ali reunido para com a preocupação do material e do espaço geral a ser conquistado.

Para o grupo originalmente ligado à produção bidimensional, formado por Fulvia Gonçalves, Berenice Toledo, Suely Pinotti e Noboru Ohnuma, a experiência tridimensional e exterior era um desafio a ser cumprido.

As orientações finais perceptíveis no conjunto escultórico geral apontam para valores tais como: privilégio da linguagem abstrata (Marco do Vale, Berenice Toledo, Gastão Manoel Henrique, Noboru Ohnuma), o emprego do material-base concreto (Gastão Manoel Henrique, Berenice Toledo, Fulvia Gonçalves) e a produção de painéis em grandes dimensões (Berenice Toledo e Fulvia Gonçalves).

Essa configuração de linguagem, material e dimensão formula três aspectos constitutivos do conjunto escultórico que se principiava apontando uma conduta criativa que pressupõe uma estratégia desenvolvida para o projeto Artes no Campus como solução que garantia certa visibilidade e longevidade às propostas. Para parte daquele grupo, mais que a continuidade das experimentações e pesquisas pessoais, a escolha desses elementos constitutivos estéticos orientava a experiência com o espaço aberto e público da universidade do qual participavam como membros fundadores e indicava também a possibilidade executiva dos projetos pela ajuda e infra-estrutura do ESTEC – Escritório Técnico de Construções que trabalhava nas obras de construção civil do campus.

A fragilidade de alguns projetos e a adequação ao formato dos painéis de concreto de outros deixa mais evidente o cuidado que o deslocamento do bidimensional para o tridimensional exigia naquele momento. Essas soluções são visíveis nas peças criadas pelo grupo ligado originalmente a bidimensão que opta pela constituição de peças elaboradas no formato de painéis.

Isso ocorre com os projetos de Fulvia Gonçalves e Berenice Toledo e de Suely Pinotti. O trabalho de Fulvia Gonçalves apóia-se na figura materna como temática principal. A série de painéis intitulada de Mater (figura 3) recobre as quatro fachadas externas dos prédios do Caism – Centro de Atendimento Integral à Mulher buscando aliar as pesquisas pictóricas que trabalhava no período ao projeto das intervenções pelo campus. Fulvia chega a esse resultado inscrevendo, por meio de relevos (figuras 3a, 3b e 3c), formas que sugerem a figura feminina em pose meditativa.

Berenice Toledo faz uso de seus ensaios com elementos geometrizados extraídos do ritmo de crescimento da natureza criando o painel Vegetais (figura 1). Estudando primeiramente numa maquete o movimento das luzes nos formatos criados para os baixo relevos do painel, Berenice Toledo propõe a analogia do crescimento dos vegetais com a simetria da matemática. A peça preenche uma das fachadas do Cecom que é um centro de medicina para doenças oncohemorrágicas na infância.

Suely Pinotti desenvolve uma escultura construída numa placa de concreto em que emerge a figura vazada de uma criança. Explora nessa obra, intitulada de A criança e o Universo (figura 2), os mesmos elementos da pintura a que se dedicava no período. Disposta em frente ao prédio da Faculdade de Educação propõe uma ligação entre a vocação da Faculdade com universo infantil.

A opção de Noboru expõe uma idéia de fragilidade e apelo à transparência dados pela manutenção de elementos fiéis à linguagem bidimensional: o trabalho intitulado de A cor na paisagem (figura 5c) constituía-se de quatro placas de vidro blindado que continham manchas de tinta emplastadas entre elas. Unidas por uma estrutura de metal e uma base de sustentação de concreto funcionava como uma grande lâmina transparente disposta na posição vertical (ver processo de elaboração nas figuras 5 e 5a). A sua colocação em uma pequena praça-rotatória num trecho da universidade que concentra os departamentos ligados à medicina é até hoje uma das áreas mais afastadas dos centros de concentração de estudantes e funcionários, situação que acaba permitindo que o trabalho fosse depredado e destruído completamente tempos depois.

A outra parte do grupo desses artistas, dedicada à tridimensão, estende sua pesquisa criativa empregando diferentes materiais e modos construtivos. Isso ocorre com a peça em aço cor-ten de Marco do Valle e com a estrutura de terra cota de Akiko Fujita.  Deste grupo, Gastão Manoel Henrique é o único que mantém o uso do concreto para uma peça em grandes dimensões. Acabara de ser premiado com uma bolsa Vitae para a área de Artes Visuais e estudava ampliar seu repertório criativo para peças em locais abertos e públicos. Como escultor sempre fez uso intenso da madeira, mas o concreto é também

material conhecido e aplicado em outros projetos. Para a peça Sem título que elabora para esse projeto do campus (figura 4) constrói uma unidade modular obtida a partir de um paralelepípedo de seção retangular. A complexa estrutura de volumes geométricos provocaram dúvidas nos projetistas do ESTEC que colaboraram para a sua execução (figuras 4a e 4b). Relembrando essa relativa dificuldade da execução de seu projeto, o artista declara que a primeira forma feita continha problemas e teve de ser refeita. Aplicada diretamente sobre o gramado que apresentava o primeiro prédio da Faculdade

de Ciências Médicas (figura 4c) a peça contrasta sua rigidez com as formas naturais da rampa de acesso ao prédio.

Marco do Valle constrói uma estrutura de 8 x 4 metros em aço projetando uma haste que se estende paralela ao eixo de rotação da Terra. Uma espécie de relógio cósmico que derivava dos estudos que estava fazendo à época sobre a força gravitacional e sua relação com os hemisférios da Terra.

O título Eixo paralelo ao da Rotação da Terra (figura 6 e 6a) denotava parte do sentido de localização e interação pública pretendida por ele com esse trabalho no campus. Imaginava que a frequentação da praça central onde a escultura foi instalada propiciaria o encontro e a observação noturna, por parte dos usuários da universidade, daquele céu aberto e configurado a partir desse eixo. A sensação de se orientar astronomicamente integrava o conceito principal do trabalho que pretendia uma extensão futura para o outro hemisfério. Marilena Chauí descreve a peça como “um trabalho que não repousa sobre um pedestal, mas pousa docemente sobre a terra, que não oferece a imagem de outras coisas, mas é plenamente a coisa.” [9]

Quando avaliamos o conjunto inicial quanto à sua disposição espacial no campus percebemos distintas tessituras nas conexões entre as peças e seus lugares de instalação. As ligações entre obra e o lugar apontam para a consideração de pelo menos duas condutas criativas diferentes: uma delas revela a noção de auto-referência das peças, de certa independência do entorno e a outra conduz à noção da site specific art [10] praticada por artistas desde meados dos anos 70 até hoje. Desse conjunto inicial apenas

a obra de Marco do Vale demonstra a aplicação de conceitos de especificidade espacial. De forma mais flexível o trabalho de Akiko Fujita também apresenta uma conexão afetiva e estratégica na escolha do lugar a ser instalado o trabalho.

Vinda do Japão para o Brasil, Akiko Fujita instala-se em Campinas e é contratada como professora do departamento de Artes Plásticas. Respondendo ao apelo do projeto Artes no Campus, Fujita desenvolve um trabalho de grandes proporções que batiza de Monumento a Campinas (figura 7b e 7c).

Continuando sua pesquisa com esculturas em cerâmica que podem ser habitáveis, entendidas como arquiteturas-escultóricas, como chamavam os críticos e jornalistas à época, Fujita cria no mesmo ano de 1985 dois projetos para espaços abertos de universidades.[11] Para Campinas, ela reúne como corpo executivo do projeto a população moradora de Barão Geraldo (Bairro que cerca a Universidade) e mais os estudantes e voluntários que atendem ao seu chamado por meio da imprensa e de cartazes de divulgação (ver exemplares xerocopiados nos Anexos da pesquisa). Com esse grupo de pessoas e 10 toneladas de argila Akiko moldou uma estrutura em terra cota de 6 x 3 metros disposta na praça Henfil, numa das entradas da Universidade. Pretendia que o lugar significasse um convite aberto à comunidade para o campus.

Para suas estruturas externas que são criadas a partir da terra modelada Akiko defende a idéia de que devem se desfazer com a ação do tempo voltando à terra.[12] Esse percurso foi, contudo, bruscamente abreviado no projeto da Usp que teve a peça destruída pouco tempo depois de executada e tem continuado sua redução a terra na escultura da Unicamp não sem a ajuda de certa depredação dos usuários locais.

Com exceção desses dois casos, todos os demais trabalhos desenvolvem-se a partir da noção de auto-referência da escultura, dialogando de modo menos conectado com o espaço que ocupam ou as circunstâncias físicas e locais ali presentes. Essa auto-referência serve-se bem dos procedimentos que estão sendo adotados pela reitoria para o planejamento do campus. É preciso reiterar aqui que a escolha desses lugares de instalação estava sendo feita num campus em pleno processo de expansão e consolidação.

A paisagem que se oferecia ao grupo era, portanto, de constante transformação. Assim, devido à ligação do projeto Artes no Campus com os trâmites da reitoria empenhada no desenvolvimento de novos institutos e departamentos percebe-se uma estreita ligação entre algumas das peças e a criação dos novos prédios que as abrigam. Essa proximidade não chega a configurar o conceito de especificidade espacial para tais projetos, mas colabora no entendimento dos impulsos gerados para sua criação no campus. Os painéis de Fulvia Gonçalves localizados num importante centro de saúde feminina de referência nacional, marca da gestão Pinotti, ratificam essa postura até hoje[13].

Assim, dentre os anos de 1985 e 1989, o campus é ocupado com sete projetos advindos de representantes do Instituto de Artes cujas obras espalham-se pelos jardins e praças ladeando ou apresentando formalmente os novos prédios construídos para a comunidade universitária.

Nos sete primeiros projetos a atuação dos departamentos da universidade incumbidos da manutenção e organização urbanística do espaço comum do campus se fez presente. Ligado à Prefeitura do Campus, o já citado ESTEC, não somente destinou mão de obra e materiais para os trabalhos artísticos como orientou e determinou a viabilidade técnica das escolhas dos lugares eleitos ou sugeridos pelos artistas ou reitoria[14]. Esse envolvimento estratégico apresenta uma cumplicidade técnica e administrativa na condução da coleção que se iniciava.

Essa primeira investida sobre o espaço aberto do campus acontece paralelamente ao contínuo desenvolvimento da Universidade e acaba sugerindo a instalação de novas peças escultóricas então desvinculadas da proposta inicial Artes no Campus tanto quanto se apresentam descompromissadas com a paisagem geral da universidade.

Com isso podemos afirmar que o projeto Artes no Campus, acompanhado dos projetos de Artistas Residentes, marcam, também, a fase mais pública de todo o processo de formação da coleção de obras artísticas da Unicamp.

Projetos especiais – PAR – programa do artista residente

As atividades de implantação do departamento de Artes Plásticas privilegiavam intensamente em seus primeiros anos as trocas entre artistas e a comunidade do campus. Era o momento da formulação inicial dos cursos e cadeiras da graduação em artes visuais e assim, quase como uma continuidade das primeiras oficinas oferecidas ao público, instituem-se os PAR – Programas de Artistas Residentes que, uma vez convidados pelos departamentos, passariam certo período de tempo no campus realizando propostas artísticas com a ajuda dos professores, alunos e comunidade.

Dois desses artistas-residentes deixaram contribuições para a compreensão da formação da coleção tridimensional da Unicamp. Foram eles: Ricardo Basbaum e José Roberto Hofling. Implantaram projetos de cunho efêmero, porém com características de Arte Pública revelando, assim, sintonia com o sentido das esculturas avaliadas anteriormente.

José Roberto Hofling dedicou-se ao programa de Artista Residente no ano de 1986. Propôs a execução de uma peça escultórica construída a partir de uma estrutura de ferro resgatada das sobras e sobras de materiais comuns naquele campus em construção. Do mesmo material da estrutura principal, de dimensões aproximadas a 6 x 2 metros na parte superior, Hofling construiu uma base alta (cerca de 2 metros) “mal dimensionada para seu peso” [15]. A intenção era realmente essa, a da fragilidade da base em suportar a estrutura vazada de ferro que ficava apoiada sobre ela. Com a ajuda de um guindaste, a parte superior foi disposta sobre essa coluna (figura 9).

A resistência da estrutura, exposta ao tempo e aos ventos comuns do lugar, compilaria o tempo planejado para sua existência no campus na busca “manifesta de que ela, uma hora ou outra tombasse”, como descreve o próprio artista. De fato, a estrutura cedeu alguns meses depois de instalada no gramado próximo ao atual prédio do Instituto de Artes. O título dado à peça foi Peixe e sob a coluna, Hofling havia feito uma base de concreto em que deixava impressa a frase de Bertold Brecht: “Destas cidades nada restará além do vento que as varrerá”.

Convidado mais tarde para restaurar a peça, o artista preferiu manter-se fiel à idéia inicial do projeto que já previa sua decomposição e não aceitou a tarefa. Assim, os materiais desprendidos foram levados do gramado e admitidos novamente como sucata. Os registros do projeto mantêm-se apenas por poucos depoimentos além dos arquivos do próprio artista que conta com a seqüência fotográfica realizada na data de sua instalação.

Ricardo Basbaum foi convidado para o Projeto de Artista Residente no ano de 1987 e passou os meses de março a dezembro desenvolvendo o trabalho que batizou de Olho. O projeto formulou-se a partir de uma série de intervenções no campus com a uma marca gráfica simples e impactante de um olho aplicada sobre os mais inusitados formatos em objetos inanimados dos edifícios do campus. A incisão mais marcante aconteceu e perdurou no campus até o início desse ano de 2003 com a aplicação do olho sobre a torre da caixa d’água localizada na praça central da universidade (figura 8).

Em agosto daquele ano o artista efetuou a série de ações do projeto durante quinze dias em que distribuiu, vendeu e instalou os adesivos com a marca do olho entregando também a cópia de um texto que dissertava sinteticamente sobre o projeto.[16]

Cartazes, filipetas e adesivos somados à música eletrônica, performances espontâneas e um vídeo cobriram o evento que teve desdobramentos para os próximos anos do trabalho de Basbaum. A idéia principal estava na interface entre arte e comunicação, “numa aproximação das estratégias da arte com o campo comunicativo das sociedades de controle” como coloca o próprio artista nos textos que cria para os projetos imediatamente posteriores, derivados desse trabalho[17].

O projeto Olho foi apresentado na mostra “Como vai você, Geração 80?” (Parque Lage, Rio de Janeiro, 1984) e pretendia discutir a relação perceptiva que as pessoas estabelecem com os objetos das paisagens que habitam. A marca do olho traz o elemento de sensibilização das superfícies inanimadas, retira-as da sua opacidade caracterizando-as por meio de um processo de antropormofização que permite a inversão da relação observador-objeto. São os objetos que agora nos observam.

Tecendo um percurso estratégico de contaminação da marca do olho pelo campus, Basbaum caminhou, panfletou, vendeu, colou cartazes que repetiam incessantemente sua marca do olho.

Essa idéia da repetição buscava intensificar o valor sígnico do projeto além de provocar novas reações participativas por parte do público exposto àquele processo artístico.

É interessante observar que, depois do efeito disseminado pelos eventos realizados em torno do teatro de arena que abriga a torre da caixa d’água, a capacidade comunicativa estabelecida por essa marca visual (figura 8a) e pela série de interações públicas efetuadas caíram numa imanência silenciosa. Contudo, a marca da caixa d’água continuou espreitando a vida do campus até bem recentemente, enquanto resistia ao tempo, influenciando várias gerações de artistas que estudaram no Instituto de Artes e que por sua vez praticaram invariavelmente a pesquisa do desenho de observação dos espaços externos e abertos da universidade.

A torre com seu olho agia de modo totêmico sobre a paisagem do campus. Mesmo sem compreender completamente seu histórico os estudantes mais observadores sempre comentaram a existência cautelosa daquele signo na paisagem. Com a pintura, a torre da caixa d’água teve retirada a placa de vinil que desenhava o olho já, em parte, tomada por danos da ação do tempo. Perde-se com isso, o resíduo restante desse projeto de intervenção.

Além desses, aconteceram outros projetos de Artista Residente. Contudo, esses dois casos foram os projetos com resíduos e constatações de ações e propostas artísticas tridimensionais que melhor se intercalaram na seqüência temporal da coleção aqui estudada representando o tratamento oficial e as condições criativas sobre as quais  interessam fazer uma análise mais ponderada.

Capítulo 2 Dos novos projetos

A ocupação individualizada dos espaços por instituto da Universidade

A continuidade do histórico da coleção de peças tridimensionais da Unicamp individualiza suas ações depois dos projetos Artes no Campus e aquelas do PAR. Novas obras são adquiridas pela Universidade em regime de doação e são dispostas em locais que, na maioria das vezes, definem a iniciativa daquela conquista.

A partir do final da década de 80 e ao longo dos anos 90, as aquisições foram orientadas pelas diretorias dos institutos e faculdades do campus além da própria reitoria. O trânsito dos acadêmicos pelo circuito artístico cultural e de eventos de São Paulo, somado ao prestígio crescente da Universidade, facilitam as doações intermediadas por Fundações como Maria Luisa e Oscar Americano, Bienal Internacional de São Paulo, dentre outras empresas como a Metalúrgica Sandwik do Brasil.

A participação do Instituto de Artes nesses processos é consultiva e nem sempre requisitada. Não existe ainda um conselho curador ou comissão específica a quem se deva recorrer apesar do pedido do então diretor do Instituto de Artes, prof. Dr. José Antonio de Almeida Prado em ofício encaminhado à reitoria ainda no ano de 1985 [18].  As novas aquisições acontecem por meio de documentação oficial emitida pela Administração Geral do Campus ou da Reitoria dirigindo-se à diretoria do Instituto de Artes ou a chefia de departamento de Artes Plásticas para eventual consulta.

Dessa maneira, os jardins e passagens públicas vão ganhando peças que se somam as primeiras constituindo um cenário que pode ser entendido como positivo para o formato convencional da coleção que vai sendo formada, dado o entendimento de sua expansão, mesmo que de modo um tanto aleatório e pouco legendado para o público do campus.

Dentre essas peças destaca-se a doação da escultura em ferro Nuova Identitá (figura 10) de Simon Benetton. O processo de abertura da doação[19] é feito pelo importador Eduardo Spinelli que trabalhava na liberação das peças do escultor presente na Bienal Internacional de São Paulo naquele ano de 1991. Benetton encaminha uma carta de punho reiterando o interesse em realizar a doação à Universidade.

A avaliação da doação é feita pelo chefe de departamento de Artes Plásticas, o prof. Álvaro de Bautista[20]. A obra é instalada próxima ao prédio que abriga a atual galeria do Instituto de Artes em lugar bastante evidente e aberto, porém sem qualquer sinalização. Muitas pessoas do próprio instituto sequer sabiam da autoria e do processo que envolvia a peça.

Procedimento parecido foi estabelecido pelo Instituto de Linguagem – IEL para a doação das peças do escultor húngaro Károly Pichler.

Károly e sua esposa chegaram ao Brasil no imediato pós-guerra instalando-se em São Paulo. Lá desenvolve uma carreira como ceramista e escultor. Com a morte do marido, Edith Pichler propõe ao Instituto Maria Luisa e Oscar Americano de São Paulo a doação de uma série de obras em ferro de Károly. Segundo seu depoimento, que acompanha o currículo criado para a documentação da doação à Unicamp[21], Edith seleciona a doação de sua coleção de esculturas para o Instituto M.L.O. Americano por ter ficado muito bem impressionada com o lugar e com o cuidado do trabalho ali exercido. Demonstra uma intenção inicial de que as peças permanecessem juntas na Fundação. Contudo, na década de 80 a Fundação faz o repasse de parte dessa doação para outras instituições como é o caso da Unicamp.

Alexandre Eulálio, professor titular da cadeira de Crítica e História Literária do IEL atua na fundação organizando o material informativo referente ao século XIX.

Mantendo assim um contato estreito com os andamentos daquela instituição solicita formalmente a doação de duas peças para a Unicamp conseguindo que o IEL as receba. São elas: O pássaro de fogo, de 1968 (figura 11b) e outra peça Sem título, (sem data) (figura 11), ambas expostas na Bienal de São Paulo do ano de 1991.

Quem encaminha o processo de doação é diretor do IEL, prof.dr. Jesus Durigan. Na troca de documentos entre a direção do IEL e as Administrações do Gabinete do Reitor e Geral da Universidade percebe-se que o Instituto de Artes é citado apenas como ponto de referência geográfico. É expressa a intenção nesses documentos de que as peças ficassem dispostas no trajeto de passagem entre os dois institutos que são vizinhos[22].  Contudo, as peças são colocadas num grande jardim interno formado entre os acessos dos prédios do IEL. Expostas ao tempo fazem agir o metal que originalmente é elaborado por Pichler sem pintura como se comprovam nas fotos que apresentam as peças ainda em exposição na Bienal de São Paulo (figuras 11a e 11c). Na gestão do prof. dr. Vanderlei Geraldi as peças recebem uma camada de tinta verde escuro numa tentativa de proteção contra a ação da ferrugem. Na próxima gestão, retomando os arquivos do processo da doação das peças, o então diretor do IEL prof. dr. Luis Dantas, revê a sua disposição trazendo-as para a configuração mais próxima ao termo inicial do documento que mencionava a interação entre o IA e o IEL. Dispõe as peças na passarela coberta que ladeia o jardim e o acesso para o Instituto de Artes deixando-as mais protegidas da ação do tempo. Receberam uma limpeza que incluiu uma nova pintura, agora vermelha, além da criação das legendas de identificação. O arbítrio para a escolha da tinta e das cores reitera a postura crítica de independência que caracterizará essa fase do processo de crescimento da Coleção. Fica claro que o procedimento não passa por uma avaliação técnica ou estética, mas sim toma como intenção legítima cumprir com a proteção daquele sob tutela do Instituto de Linguagem da Unicamp.

Uma nova peça é acrescentada à coleção na passagem de 1989 e 1990. A FEM – Faculdade de Engenharia Mecânica através de sua direção recebe a peça Movimentos do Mar do artista Osni Branco. Depois de participar de uma Feira de Metalurgia no pavilhão do Anhembi em São Paulo essa peça foi doada para a Universidade através dos contatos dos professores e da diretoria da faculdade com representantes da Empresa, expositora no evento, Metalúrgica Sandvik do Brasil.

Construída a partir da solicitação dessa empresa a peça foi o primeiro trabalho em aço inoxidável do artista Osni Branco e foi pensada para ocupar grandes espaços como o que a aguardava no prédio do Anhembi. Lá ela se constituía de outros elementos que não estão mais presentes na sua atual configuração exposta no campus. Contava com tubos de inox justapostos na horizontal e a instalação de uma iluminação em néon azul.  Segundo o depoimento do artista que vive hoje no Japão, “a obra se prestaria melhor à noite, podendo ser usada em grandes ambientes ou ao ar livre (…)” [23]

Luis Roberto Ribeiro Xavier, professor da FEM bastante envolvido com o processo de recepção dessa peça foi incumbido por seu diretor, o prof. José Tomaz a buscar um lugar adequado para a recepção da peça. A fachada do prédio foi o lugar escolhido, pois, segundo depoimento de Xavier, teria ali garantida a sua melhor visibilidade no conjunto de prédios dessa faculdade. Essa obra tem uma legenda, incrustada na própria peça, afixada pelo departamento responsável da FEM. O procedimento irregular interfere ainda mais na apresentação da peça e reitera, novamente, a total independência do processo de doação e instalação da obra no conjunto geral do campus. Não há nesse processo qualquer participação, consulta ou colaboração do Instituto de Artes.

Com o 20º aniversário da Unicamp no ano de 1986 uma nova peça é acrescentada à coleção. Organizou-se para esse ano um concurso aberto ao público para a criação de um monumento comemorativo. O Departamento de Artes Plásticas coordenou os trabalhos tendo à frente da Comissão o prof. Marco do Valle. Foram inscritos 70 projetos dos quais 26 foram expostos na Galeria conforme previsto pelo seu regulamento[24]. O projeto escolhido foi o de autoria de Elizabete Maciel Martinho, Adriana Regina Biella Prado e Cecília Rodrigues. A seleção foi feita pela equipe formada por dois professores do departamento de artes plásticas (Bernardo Caro e Eduardo Subirats), dois críticos de arte (Alberto Buttenmuller e Marcos Rizolli) e um membro indicado pela Unicamp (João Baptista da Costa Aguiar). Curiosamente o regulamento desse concurso dirigia a inscrição para artistas plásticos não citando arquitetos. Muitos artistas se inscreveram, mas esse projeto escolhido foi o de um grupo de arquitetas representadas por Elizabete Maciel Martinho.

Na ata da Seleção e Premiação do projeto destacam-se alguns pontos adotados pelo júri para a escolha final. Interessa apontar para o contexto deste estudo da coleção o trecho que evidencia que “por concepção estética entende-se que o projeto é, principalmente, contemporâneo. Além disso, possui  harmonia de formas, criando leveza no material concreto, nem sempre conseguido por artistas do ramo.” [25]

Na matéria da imprensa que divulgava os resultados da seleção Marco do Vale anunciava a disposição espacial que seria ocupada pelo monumento, próximo ao balão de entrada principal da universidade, localização que estava sendo ainda negociada junto ao Parque Ecológico da Unicamp [26]. Dada a relativa importância da história da Universidade demarcada pela inserção desse monumento pode-se ver instalada uma placa com a legenda descritiva desse projeto.

Este é o universo de obras tridimensionais expostas em espaços abertos da Unicamp. A série de quatorze peças/projetos conta atualmente com três trabalhos totalmente destruídos restando efetivamente para a coleção, na parte que pode ser vista pelo público, um número relativamente modesto de onze peças. Parte da memória das ações e dos projetos só puderam ser resgatados por depoimentos e cessões de imagens, dados e documentos dos arquivos particulares e da memória dos próprios artistas e de professores envolvidos com os tramites administrativos no período das aquisições independentes dos institutos e faculdades. Das 11 peças existentes apenas 06 delas possuem legenda e nem todas em boas condições de visibilidade. As lacunas na documentação escrita ou áudio-visual refletem a falta de um organismo condutor dessa coleção que pudesse exercitar sua constituição e memória.

A maioria das peças sofre com a ação do tempo e a intervenção dos usuários do campus que depositam copos, colam adesivos ou se apóiam em sua sombra para esperar a longa fila de determinado setores de atividades da universidade em que parte delas está situada. Os funcionários mais antigos revelam nos depoimentos colhidos fragmentos de memória sobre a recepção, instalação e cuidados dessas peças. Os atuais alunos e funcionários questionados não identificam a existência de muitas delas, principalmente aquelas relativamente camufladas pelo urbanismo criado ao seu redor ou instaladas muito distantes do seu trajeto comum no campus.

Capítulo 3 Da Esquematização dos dados

Outro modo razoavelmente esclarecedor para entendermos a noção de conjunto admitida por esta coleção de peças pode ser feito por meio de seu levantamento mais sistemático. Assim, apresenta-se aqui um sistema de compilação de dados através de fichas de identificação para que se possa pensar nas peças por seus aspectos técnicos ou individualmente.

Os dados descritivos atribuídos buscam formatar elementos comuns do processo museológico a que são submetidas quaisquer coleções sistematizadas bem como investigar a legibilidade de cada peça dentro do campus por meio de legendas, relação da criação do trabalho com o seu lugar de instalação e observações sobre sua atual configuração física e local.  A apresentação segue a ordem temporal do recebimento em doação das obras pela universidade que, em muitos dos casos, obedece à própria data de sua execução. Alguns dados ainda precisam ser completados.

01 Suely Pinotti título Técnica / material Dimensões
A criança e o universo Concreto, vidro e latão 120 x 016 x 242 cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda não
Peça criada especificamente para o lugar Jardim da Faculdade de Educação Data  de execução: 1985
Obs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
02 Noboru Ohnuma título Técnica / material dimensões
A cor na paisagem Placas de vidro, armação de ferro, tinta e concreto 120x050x200cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Não
Peça criada especificamente para o lugar Praça  Rotatória do Hospital da Unicamp Data de execução: 1985
OObs Obra destruída;Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
03 Akiko Fujita título Técnica / material dimensões
Monumento a Campinas Cerâmica 600 x 300 x 200cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Não
Peça criada especificamente para o lugar Praça Henfil – entrada da universidade Data de execução: 1985
OObs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
04

Berenice Toledo

título Técnica / material dimensões
Vegetais Relevo de concreto 9 x 9,3 m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Não
Peça criada especificamente para o lugar CECOM Data de execução: 1986
OObs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
05 Fulvia Gonçalves título Técnica / material dimensões
Mater 4 painéis de concreto 10,5 x 10 m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada especificamente para o lugar Fachada do CAISM – Centro de Assistência Integral à Mulher Data de execução: 1986a

1988

Obs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
06 Marco do Valle título Técnica / material dimensões
Eixo Paralelo ao da rotação da Terra Aço cor ten 8 x 4 x 2m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada especificamente para o lugar Jardim central da Unicamp – Praça da Paz Data de execução: 1987
OObs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
07 Gastão Manoel Henrique título Técnica / material dimensões
Sem título Concreto armado 4 x 2 x 1 m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Não
Peça criada independentemente do lugar Jardim do CECOM (primeiro prédio da Faculdade de Ciências Médicas) Data de execução: 1988
OObs Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
08 Károly Pichler título Técnica / material dimensões
Sem título Ferro 41 x 41 x 253 cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada independentemente do lugar Corredor do IEL – Instituto de Línguas Data de execução: Sem data
OObs A peça recebeu duas camadas de tinta. A camada atual tem a cor vermelha; a primeira delas era verde escuro Data de doação: 1985
09 Károly Pichler título Técnica / material dimensões
Pássaro de fogo Ferro 62 x42 x 264 cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada independentemente do lugar Corredor do IEL – Instituto de Estudos da Linguagem Data de execução: 1968
OObs A peça recebeu duas camadas de tinta. A camada atual tem a cor vermelha; a primeira delas era verde escuro Data de doação: 1985
10 Elisabeth Maciel Martinho; Adriana Regina Biella Prado e Cecília Rodrigues título Técnica / material dimensões
Monumento comemorativo ao 20º aniversário da Unicamp Concreto armado 7m (h) x 11 m (raio)
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada independentemente do lugar Jardim próximo ao balão de entrada principal do campus Data de execução: 1986
OObs Obra resultada de concurso público Data de doação: 1986
11 José Roberto Hofling título Técnica / material dimensões
Peixe sucata c. 6 x 2 x 2 m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada especificamente para o lugar Gramado do prédio do Instituto de artes Data de execução: 1986
OObs Projeto criado dentro do programa do Artista Residente da Unicamp (PAR) O trabalho era perecível e não existe mais. Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
12 Ricardo Basbaum título Técnica / material dimensões
O Olho Fórmica
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Não
Peça criada especificamente para o lugar Todo o campus e em particular o teatro e a torre Caixa d’água da Universidade Data de execução: 1987
OObs Projeto criado para o programa de Artista Residente. A peça  restante da intervenção foi destruída recentemente. Não existe documento efetivo da doação Data de doação:
13 Osni Branco título Técnica / material dimensões
Movimentos do Mar Painel Aço inoxidável 8 x 4 x 1,3 m
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda Sim
Peça criada independentemente do lugar Fachada da Faculdade  Engenharia Mecânica Data de execução: 1988
OObs Data de doação: 1989
14 Simon Benetton título Técnica / material dimensões
Nuova Identitá Ferro 285 x 85 x    cm
Tema x especificidade de lugar Disposição no campus legenda não
Peça criada independentemente do lugar Jardim entre a Galeria de Arte da Unicamp e o Restaurante universitário Data de execução: 1991
OObs Data de doação: 1992

Conclusão Panorama Geral da Coleção da Unicamp

O entendimento do conjunto de obras escultóricas públicas presentes hoje no campus da Unicamp permite-nos fazer uma leitura dividida de seu contexto em duas etapas: a primeira delas é a fase inicial do povoamento de esculturas sob o projeto Artes no Campus em que os professores-artistas pensam o espaço aberto como território para implantação de seus projetos. A segunda etapa é representada por diferentes orientações estéticas e procedimentos de exposição aplicados às novas peças escultóricas adquiridas como doação resultante do olhar e do interesse individualizado das diretorias de cada instituto ou faculdade. Essas novas peças são trazidas pelos institutos para seu espaço aberto e demonstram certo descompasso dos códigos formulados pelo conjunto inicial especificamente por se dirigirem menos ao campus do que ao território localizado daqueles departamentos que as acolhem.[27]

Nesse desdobramento altera-se o trajeto de implantação espacial das esculturas pelo campus já que não se tratam mais de novas esculturas feitas por artistas professores que vivenciam ou trabalham no Instituto de Artes ou artistas convidados a trabalharem nesse espaço universitário seguindo uma conduta de conjunto.

Essa abertura, inevitável, para a continuidade da coleção, demarca um momento importante para a correta compreensão da coleção uma vez que pontua a necessidade de se organizar o conselho curador ou organismo equivalente para avaliar e promover a manutenção e exposição adequada de cada nova peça a ser acrescentada.

Como o primeiro modelo de ocupação das esculturas não consegue implantar um Conselho Curador extensivo ao espaço do campus vale a lei da iniciativa em relação ao espaço disponível. Com isso, a seqüência da coleção prossegue definida por certo desafinamento dos projetos escultóricos quanto à sua forma de ocupação física, montagem, apresentação e orientação estética do conjunto que oscila entre o modernismo tardio e a vertente contemporânea.

A sorte das escolhas estilísticas evidenciam ainda mais o modelo individualista e muito pouco público adotado por cada Faculdade ou Instituto presente no campus fragilizando, assim, o conceito mais convencional de coleção.

A Unicamp não possui um Museu de Arte, mas dispõe de uma Galeria de Arte atrelada às atividades do Instituto de Artes. O trabalho desenvolvido ali dispõe de um Conselho Curatorial de professores que avaliam as propostas para a agenda de seu espaço interno, mas não prevê a extensão dessa preocupação com a distribuição de obras de arte externas e de caráter público do campus apesar de algumas tentativas isoladas terem sido iniciadas.[28]

O interesse no contexto espacializado em que se inserem os objetos artísticos tem transmigrado nas últimas décadas para além do território da Arquitetura e do Urbanismo fazendo com que o espectro das Artes Plásticas entenda sua participação efetiva nesse processo de modo crescente, porém como nesse caso da Unicamp, com certa lentidão. Como não se efetiva uma intervenção técnico-política do Instituto de Artes ou de seu departamento de Artes Plásticas e Galeria perante as novas contribuições para o conjunto escultórico que vai sendo organizado a visibilidade e a integridade das próprias peças acrescidas sofre severos danos.

Um dos exemplos mais evidentes dessa circunstância está na pintura das peças de Károly Pichler. Feitas em duas ocasiões distintas, que pretendiam proteger a peça do seu próprio mecanismo constitutivo original as camadas de tinta aplicadas às peças de Pichler, uma primeira verde escura e tempos depois outra vermelha, demonstram um grau de arbitrariedade ao contexto inicial das peças e ao próprio conceito do conjunto de uma coleção.

Quando somamos o caráter de auto-referência da maioria das peças criadas à sua frágil noção de conjunto chegamos a um problema comum ao estatuto da Arte Pública e Urbana. Tal qual acontecem nos grandes centros urbanos, também os campi universitários tem tido seus monumentos e esculturas depredados, esquecidos e desprezados por parte de seus usuários freqüentes.

O diagnóstico aplicado à própria concepção da arte moderna, em especial à escultura e seu estado de auto-suficiência, de independência dos espaços ornamentados dos museus e da base que a aprisionava, serve-nos aqui como índice que explica parte do afastamento do público dessa qualidade de objeto artístico gerando o estado latente de invisibilidade dessas peças.[29]

A errância dessas esculturas aliada ao aumento do fluxo e da passagem em detrimento dos pontos fixos e dos marcos urbanos distanciam progressivamente a receptividade pública desse conjunto de obras sejam elas compostas pelo universo mensurável de um campus universitário ou mesmo pelo complexo território de uma megacidade.

A noção de pertença das peças pelo público usuário desses espaços já não desempenha força suficiente. Assim, significa muito pouco a sua perda ou sequer a sua apreensão.

Nos estudos que faz sobre o hibridismo cultural Nestor Garcia Canclini discute a agonia das coleções no modelo tradicional comparando-a a antiga divisão espacial e intelectual dos objetos, espaços e identidades usualmente aplicadas ao meio urbano. Procurando reintroduzir algumas questões sobre os usos moderno e pós-moderno da história assume uma postura bastante provocativa empregando sua atenção no estudo de alguns monumentos do México (figuras 14 e 14a) que lhe servem como base para discutir a sua ressemantização em meio ao novo estatuto das cidades e sua inter-relação com a comunicação de massa e a política.

Estuda a reinserção social e cultural possível aos monumentos da história do passado desse povo a partir da intervenção dos códigos atuais urbanos, do seu estreitamento com a tecnologia e os meios de comunicação. Assim, buscando interpretar a inatividade dos objetos históricos detidos dentro das coleções de museus convencionais cuja compreensão se oferece ao público atual de modo compartimentado chega à fluidez e atividade desejadas para a compreensão do movimento social como um todo por um caminho bastante duro. Toma os monumentos expostos, a partir de sua interação prática

com a vida cotidiana urbana. Discute a sua sobrevivência a partir da ressemantização efetuada na atualidade que transporta os monumentos para a condição ativa de palcos de discussões políticas, marcos das passeatas, suportes da intervenção eventual de pixações ou da aplicação de cartazes que demonstram, contudo, algum tipo de especificidade desse novo uso. Apesar disso, não discute nessa análise que o elemento material e resistente do qual são feitos esses monumentos representam uma conduta criativa típica do passado nem sempre continuada no presente e que é graças à esse sentido de duração e permanência aplicado aos moldes acadêmicos e até modernistas em que foram constituídos os monumentos estudados, que se pode hoje reordenar os seus significado e uso.

Os pontos levantados por Canclini nos interessam, portanto, pela abertura e mobilidade que propõem para o entendimento dos objetos de memória e da fruição estética dispostos no cotidiano urbano. Nesta análise, Canclini apresenta um novo procedimento comum nas sociedades urbanas atuais que intitula de descolecionismo. [30] Entende que o descolecionismo torna flexível a percepção e a inclusão dos valores de objetos reunidos como conjunto fazendo ruir alguns dos bem montados alicerces que compreendiam os modelos de coleção.

Tentando traduzir esse sentido de abertura para o caso específico da Unicamp percebemos que o desentendimento do grupo escultórico como conjunto enfraquece sua visibilidade, continuidade e manutenção como Coleção. A visibilidade das peças é bastante prejudicada pela falta de organização paisagística dos jardins de cada instituto ou dos espaços comuns entre eles. Como já apontado, em boa parte das peças não há legendas que as apresente e seu estado de conservação corresponde ao esquecimento. Contudo, a identidade dessa coleção fragiliza-se menos por conter um número pequeno de peças cuja representatividade histórica ou estética pode ser entendida como restrita, localizada ou danificada, mas sim pelo desentendimento de seu corpo enquanto conjunto. A hipótese que se constrói é a de que sua invisibilidade decorre, além dos pontos acima apresentados, do apego praticado pela maioria das pessoas (usuários, professores, corpo administrativo da universidade, institutos, etc) ao modelo tradicional de coleção.

Além das peças que figuram pelo campus, a coleção guarda referenciais importantes para a contemporaneidade artística e cultural da universidade na forma das intervenções efêmeras realizadas pelos projetos de artista residentes. Isso nos leva a pensar que essa coleção vale, efetivamente, pela incisão proposta sobre o espaço aberto do campus, quando de sua implantação, pela atualização dos códigos artísticos em forma de projetos efêmeros, de intervenção multidisciplinar, pela conduta provocativa das peças auto-referentes perante os prédios e os públicos renovados que trazem outras demandas e descompassos de leitura de sua fruição estética. [31]

Esse atrasado reconhecimento do conjunto sugere ao menos, duas leituras diferentes. A primeira delas aponta para sua desqualificação mediante a aplicação mais tradicional do modelo de coleção. As falhas no processo de sua instalação e construção acabaram afastando o interesse dos organismos responsáveis na universidade da possibilidade de sua apreensão, estudo e maior valorização. A segunda leitura propõe que esse atraso sugere também a oportunidade de sua adequação a um modelo mais atualizado de coleção, que esteja atrelado aos valores constituídos até então das coleções artísticas universitárias, mas que reflita, pelo entendimento de sua construção, uma idéia de coleção estudada, mantida e apresentada por mecanismos híbridos presentes desde sempre no seu histórico de criação.

Partindo disso, é que a coleção de obras públicas da Unicamp pode então rever aspectos de sua conformação incorporando alguns antigos condicionadores conhecidos: os cuidados com o paisagismo, a disponibilização e padronização dos dados de suas legendas; a complementação de seus processos de integralização ao acervo oficial da universidade, acrescentando a isso outros aspectos constitutivos atualizados com o dinamismo da produção artística e cultural contemporânea. A fusão desses aspectos contemplados na diversidade de peças e projetos criados para a Unicamp, que já completam dezoito anos de implantação, pode permitir a sua recondução enquanto conjunto voltado para o princípio coletivo do campus universitário.

Referências Bibliográficas

Livros:

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CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas Híbridas. Estratégias para entrar e sair da modernidade. trad. Ana Regina Lessa e Heloisa Pezza Cintrão. São Paulo: Edusp, 1998.

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Catálogos:

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Entrevistas:

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HENRIQUE, Gastão Manoel: Entrevista (outubro e novembro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Campinas: Instituto de Artes da Unicamp, 2003.

NOVELLO, Valdeir Prudente. Entrevista (novembro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Campinas: ESTEC – Escritório de Tecnologia da Unicamp, 2003.

ONUMA, Noboru. Entrevista (outubro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Campinas: Instituto de Artes da Unicamp, 2003.

PINOTTI, Suely. Entrevista (outubro e novembro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Entrevistas feitas pelo telefone, 2003.

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TOLEDO, Berenice. Entrevista (novembro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Campinas: Instituto de Artes da Unicamp, 2003.

VALE, Marco do: Entrevista (outubro e novembro 2003) Entrevistadora: Sylvia Furegatti. Campinas: Palácio dos Azulejos, 2003.

Documentos / Cartas e Ofícios:

AGUIAR, João Baptista da Costa. (et al). Ata da Seleção e Premiação do concurso “Monumento Comemorativo ao XX aniversário da Unicamp” 06 de junho de 1986. Unicamp / Acervo de Documentos do Depto de Artes Plásticas do Instituto de Artes.

ALMEIDA PRADO, José Antonio de. Ofício nº 369/85 da Diretoria do IA para o magnífico reitor – prof. Dr. José Aristodemo Pinotti,  05 de junho de 1985. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

ALMEIDA PRADO, José Antonio de. Ofício nº 550/85 da Diretoria do IA para o G.R. da Universidade, 05 de agosto de 1985. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

BAUTISTA, Álvaro de. Ofício 005/92 da Chefia de Departamento de Artes Plásticas para o Sub Chefe de Gabinete da Reitoria da Unicamp, 06 de fevereiro de 1991. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

CARO, Bernardo. Circular da Chefia de Departamento de Artes Plásticas para os professores, 28 de maio de 1985. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

COSTA, Arlete Cremosini da. Carta da Diretoria do Serviço do Patrimônio do DGA/Unicamp para a Diretoria do IEL / Unicamp, 09 de outubro de 1985. Processo nº 5843/1985. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

DURIGAN, Jesus. Carta do Diretor do IEL para o DGA –Diretoria Geral da Administração da Unicamp, 23 de setembro de 1985. Processo nº 5843/1985. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

FILHO, Orôncio Vaz de Arruda. Carta do Coordenador Cultural da Fundação Oscar Americano para o diretor do IEL – Unicamp, 21 de agosto de 1985. Processo nº 5843/1985. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

FUJITA, Akiko. Carta para o Chefe de departamento de Artes Plásticas – IA – prof. Bernardo Caro,  04 de junho de 1985. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

FUJITA, Akiko. Memorial Descritivo do Projeto Monumento Campinas. Campinas: Galeria de Arte da Unicamp, 1986. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

OHNUMA, Jerônimo Noboru. Carta e orçamentos para a reconstrução do projeto A Cor na Paisagem encaminhada para o chefe de Departamento de Artes Plásticas – IA – prof. Álvaro de Bautista, 17 de setembro de 1992.

SEMANIUC, Vera. Ofício nº 018/93 da Galeria de arte para o diretor do IA – prof. Dr. Marcius Freire,  23 de setembro de 1993. Unicamp / Acervo de Documentos da Galeria do Instituto de Artes.

Documentos / Processos Administrativos:

PROCESSO nº01P8071. Doação da Obra de Osni Branco a FEM/Unicamp. Campinas, 1989. Unicamp/ Arquivo da Faculdade de Engenharia Mecânica.

PROCESSO nº5843/1985. Doação das obras de Károly Pichler ao IEL/Unicamp. Campinas, 1985. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

PROCESSO nº6504/84. Vida acadêmica de Akiko Fujita. Campinas, 1984. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

PROCESSO nº        /91. Doação da obra de Simon Benetton à Unicamp. Campinas, 1991. Unicamp / Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos.

Documentos / E-mails pessoais:

ARRUDA, Celso. Re: Painel Escult Inox fac eng mecânica. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  09 dez.2003.

BASBAUM, Ricardo. Re: Pesquisa projeto Unicamp. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  28 nov.2003.

BRANCO, Osni. Re: Site specific e imagem original. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 15 dez. 2003.

______________. Re: Escultura da Unicamp. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 26 nov.2003.

______________. Re: Escultura da Unicamp. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 11 nov.2003.

DANTAS, Luis Carlos. Re: Esculturas de Karoly Pichler. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  09 dez.2003.

___________________. Re: Esculturas de Karoly Pichler. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  29 dez.2003.

FERREIRA, Claudia Vada de Souza. Re: pesquisa doutorado. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  03 dez.2003.

_______________________________. Re: Pesquisa sobre K Pichler. [mensagem pessoal]  Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 08 dez.2003.

HENRIQUE, Gastão Manoel. Re: dados sobre sua escultura. [mensagem pessoal]  Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 11 nov.2003.

HOFLING, José Roberto. Re: Dados da foto. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 05 jan.2004.

____________________. Re: Esculturas da Unicamp. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 27 nov.2003.

LEÃO, Flávia. Centro de Documentação Alexandre Eulálio. Re: pesquisa. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  03 dez.2003.

LEITE, José Roberto Teixeira. Re: Pesquisa sobre esculturas da Unicamp. [mensagem pessoal]  Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em 03 dez.2003.

XAVIER, Luis Roberto Ribeiro. Re: Painel Escult fac mecânica. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  05 dez.2003.

Relatório/Memorial:

GONÇALVES, Fulvia. Memória. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes (A partir de 1976). Unicamp/ Arquivo do Departamento de Artes Plásticas – IA.

FUJITA, Akiko. Memorial e projeto para o “Monumento” a ser desenvolvido no campus da Unicamp, Junho, 1985. Unicamp/ Arquivo do Departamento de Artes Plásticas – IA.

Sites na Internet:

UNIVERSIDADE de Brasília.  Mapa / Tour / Museus / Unidades Acadêmicas / Editora. Disponível em: < http://www.unb.br/academia/index.htm>. Acesso em 04 e 10/12/2003.

UNIVERSIDADE Estadual de Campinas. Instituto de Artes / SIARQ / Localização das unidades no campus. Disponível em: < http://www.unicamp.br>. Acessos em 05, 06, 09/10/2003;   07, 10/11/2003   e   03, 04, 10,18/12/2003.

UNIVERSIDADE Estadual do Rio de Janeiro. Extensão e Cultura / Faculdades e Institutos / Informe UERJ /  Editora.  Disponível em: < http://www.unicamp.br>. Acessos em 10 e 18/11/2003.

UNIVERSIDADE de São Paulo. Museus/ MAC / Editora / Mapa.  Disponível em: <http://www.usp.br>. Acessos em 10 e 18/12/2003.

UNIVERSIDADE Federal da Bahia. Museus / Graduação/ Localize-se. Disponível em: <http://www.ufba.br>. Acessos em 03, 04, 10 e 18/12/2003.

UNIVERSIDADE Federal Fluminense. Centro de Artes / Mapa / Eduff. Disponível em: <http://www.uff.br>. Acesso em 18/12/2003.

UNIVERSIDADE Federal de Minas Gerais. Museus / Mapa do Campus / Editora / Notícias. Disponível em: < http://www.ufmg.br>. Acesso em 18/12/2003.

UNIVERSIDADE Federal do Rio Grande do Sul. Museu / Mapas / Institutos / Editora. Disponível em: < http://www.ufrgs.br>. Acessos em 05; 06; 09/10/2003, 07 e 10/11/2003 e 03; 04; 10 e 18/12/2003.


[1] Podemos lembrar aqui das iniciativas do NEA – National Endowments for Arts ou do programa Art in Architecture que instituem nos Estados Unidos, já em meados dos anos 60 e 70, a aquisição pública de obras escultóricas que são criadas para espaços públicos em que se conjuga a construção de edifícios governamentais. As mais diversas formas de arte pública têm recebido apoio por parte de organismos públicos e privados para constituir paisagens de esculturas ou projetos efêmeros que respondem à demanda de organização urbana e atrativo turístico e comercial para seus centros. Dentre esses projetos citamos também: Names Quilt Project – San Francisco em 1988; Conversations in the Castle curado por Jane Jacobs no Festival de Atlanta em 1996; Changing Stations em Londres, realizado no início dos anos 1980 com artistas convidados a trabalhar junto a arquitetos e engenheiros do Metrô Londrino para atualizar o design das estações dentre outros. No Brasil são conhecidas algumas iniciativas em forma de leis municipais (Brasília, Blumenau e Joinville por exemplo) que determinam a incorporação de obras de arte em edifícios particulares ou públicos que, contudo, sofrem controversas formas de aplicação do entendimento da lei e de sua aplicação prática.

[2] Ao longo dessa pesquisa foi possível perceber as dificuldades que cercam o universo das coleções de arte pública universitárias. Das investigações em bibliotecas e sites, além da busca por outras fontes de informação como nas entrevistas com artistas e professores, depreende-se pouco material organizado ou publicado sobre as coleções. A circunstância mais curiosa fica por conta dos sites oficiais de universidades visitados. A maioria deles disponibiliza para o pesquisador os mapas do campus com a possibilidade de se verificar as ruas, os prédios e seus respectivos funcionamentos, mas em nenhum deles há, sequer como plano de localização geográfica, a indicação dos monumentos ou obras escultóricas que eventualmente podem existir em suas paisagens. O livro Obras escultóricas em espaços externos da Usp organizado pela profª drª Maria Cecília França Lourenço é um dos raros casos de organização e interpretação dos valores e méritos desse tipo de patrimônio.

[3] Os questionamentos e aberturas aplicadas ao entendimento das coleções atuais e do passado já são lançadas por Pomian em trechos como: (…) “Mas assimilar uns aos outros conjuntos de objetos tão evidentemente heterogéneos não significa comportar-se como aquele louco, levado a cena por Julio Cortázar, que por todo lado via colecções? Um escritório, dizia ele, não é senão uma colecção de funcionários; uma escola, uma colecção de alunos; uma caserna, uma colecção de soldados; uma prisão, uma colecção de detidos. O significado desta anedota é que uma aproximação de instituições que parecem díspares só pode ser legitimada na condição de ter sido fundada não numa semelhança externa, mas numa homologia de funções.”  Ver em: POMIAN, Krzystof. Colecção.In: Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Einaudi, 1985. Vol. 1 História-Memória, p. 62.

[4] Para o caso específico do objeto dessa pesquisa vale a pena ressaltar as colocações de Pomian quando avalia a homogeneidade entre todas as qualidades de coleções não pelos aspectos externos, mas sim pela identidade que guardam no intercâmbio entre o mundo visível e o invisível:  “A aproximação das colecções apenas passadas em revista justifica-se unicamente pelas semelhanças externas? Parece que pode-se afirmar que não. Apesar de sua aparente diversidade, todas estas colecções são com efeito formadas por objectos homogêneos sob um certo aspecto: eles participam no intercambio que une o visível e o invisível. POMIAN, K. Op. cit., p. 66.

[5] Pomian levanta o seguinte resumo sobre o entendimento das coleções à página 55: “1. Uma coleção das coleções. Não é difícil de se encontrar. Conjuntos de objectos naturais ou artificiais, mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito das actividades econômicas, submetidos à uma protecção especial e expostos ao olhar, acumulam-se com efeito nas tumbas e nos templos, nos palácios dos reis e nas residências de particulares.” POMIAN, op cit., p. 55.

[6] Cristina Freire cita as experiências encontradas nos acervos do MAC USP e a correspondência dessas confusões comuns a vários museus e bibliotecas do mundo utilizando-se da narrativa da passagem de Douglas Crimp pela biblioteca Pública de Nova York:  “Foi bastante revelador encontrar ao longo dessa investigação vários volumes  (livros de artista), na Biblioteca do MAC USP, sem qualquer classificação pela impossibilidade de enquadrá-los nas categorias disponíveis. A experiência de encontrar casualmente livros de artista na Biblioteca Pública da cidade de Nova York foi analisada por Douglas Crimp, que ao realizar pesquisa de imagens sobre meios de transporte, depara com um livro de fotografias de Ed Ruscha  (Vinte e seis postos de Gasolina, 1962) dentro da classificação ‘meios de transporte’.  Escreve Crimp: (…) eu me lembro de achar muito engraçado que o livro tivesse sido mal catalogado e colocado junto a livros sobre automóveis, estradas, etc. Eu sabia, coisa que a bibliotecária com certeza desconhecia , que o livro de Ruscha era um livro de arte e, portanto, pertencia ao setor de arte. Mas, devido às reconfigurações trazidas pelo pós-modernismo, eu mudei de idéia: eu agora sei que o livro de Ruscha não fazia nenhum sentido dentro das categorias de arte segundo as quais os livros de arte são catalogados na biblioteca, e está justamente aí o seu mérito. O fato de não haver nenhum lugar para Vinte e seis postos de gasolina no atual sistema de classificação é um indício de seu radicalismo em relação às formas instituídas de pensamento.   In Freire, Cristina. Poéticas do Processo, 1999, p. 39.

[7]CARO, Bernardo. Circular interna enviada aos professores do depto de Artes Plásticas convocando para a apresentação de projetos. 28/maio/1985. Unicamp / Acervo da Galeria de Arte/ IA.

[8] Nos arquivos do Depto de Artes Plásticas consta uma fotocópia sem identificação de origem de uma matéria de jornal de título: “Unicamp terá obras de arte por todo o campus” que cita o desenvolvimento do projeto Artes no Campus com fotografias das maquetes dos projetos. Nesse texto são apresentados vários projetos e dentre eles alguns nunca realizados tais como as esculturas de Bernardo Caro, Rosa Yage e Claudia Dal Canton.

[9] O texto criado para a escultura foi publicado em parte no Jornal Correio Popular por ocasião do projeto C que elaborava como capa deste Caderno de Cultura um ensaio fotográfico acompanhado de textos críticos sobre o trabalho de artistas que atuavam em Campinas naquele período. CHAUI, Marilena. Projeto C 3. Jornal Correio Popular, Caderno C, 23/12/93 pag 2.

[10] “Institui-se, no cerne da Arte Urbana, uma relação de ajustamento entre espaço e projeto artístico, que tem seu embate inicial nas proposições das vanguardas artísticas do início do século XX que discutem os sentidos de independência do objeto artístico e de neutralidade dos espaços expositivos. Contudo, a ligação estreita entre obra e local de instalação [a ser conhecida como Site Specific Art ]  configura-se mais complexamente apenas anos mais tarde, com as experimentações minimalistas que nos apresentam o conceito de especificidade do local. Esse direcionamento para fora, e o encontro com a cidade ou com paisagens como as do deserto, agiu como motor da criação de obras para lugares específicos. (…) Dessa forma, o discurso original do Minimalismo adota, como princípio, forte reação ao mercado e ao cunho oficializante dos museus e galerias, impulsionando assim o interesse dos artistas por outros espaços, vistos inicialmente como soluções alternativas para a constituição de novos trabalhos mais experimentais, mas já vinculados à idéia radical da efemeridade investida na produção artística deste momento em diante. Dentre seus principais precursores nos anos 60, podemos indicar os artistas Robert Smithson, Daniel Barry, Robert Morris, Donald Judd, Michael Heizer, (…)  [Esses artistas aplicam conceitos] tais como  a experimentação física da obra, a valorização do espaço envoltório da escultura, o deslocamento da arte para paisagens distantes do urbano, dentre outras. (…) Assim, os espaços buscados por esses artistas traduziam o desejo de uma cumplicidade entre lugar, obra e espectador, pois estavam ligados a variados conceitos tais como: gravidade; obrigatoriedade da presença física; do assentamento de um local determinado, fixo, de interior ou exterior, onde são estabelecidas considerações com a distância; profundidade; altura; textura; formas das paredes das salas; escadas; proporções de praças, prédios ou parques; condições de iluminação e ventilação; padrões de caminhos percorridos pelo homem  ou ainda a distinção topográfica da paisagem. (…) [Os elementos originais da Site Specific Art reúnem] um campo de tensão potencial que interessa ao artista explorar dentro de uma linha fenomenológica, não predominantemente visual, mas sim de conotações físicas.”    Vem em: FUREGATTI, Sylvia. Arte no Espaço Urbano, 2002, p. 51/2.

[11] Além do Monumento a Campinas realizado na Unicamp desenvolve com pouquíssimo intervalo de tempo (dois dias apenas) o projeto Flores da Terra na USP (200 metros quadrados e um metro e meio de altura) que teve lugar no centro da praça do Relógio.

[12] No cartaz em que convida a população a participar da criação de suas obras acompanha o texto informativo uma descrição do processo de elaboração do trabalho: “ Akiko Fujita faz esculturas em argila há mais de 25 anos, as formas de seu trabalho, obtidas com barro, derivam de sua compreensão da figuração humana e dialogam com o ambiente físico circundante através de concepções de ‘abrigo’. Seu trabalho é dividido com estudantes, artistas e todo tipo de pessoa. Inicialmente Akiko modela com argila um alicerce labiríntico e, sobre ele, modela cones esburacados. Numa segunda fase, realiza-se a queima a céu aberto, onde a obra se torna o seu próprio forno. Na terceira fase realiza-se uma série de eventos ao redor da obra pronta, onde se lê poemas, textos de teatro, música, dança e todo tipo de manifestação artística. A idéia de Akiko é fazer do Monumento um Movimento de Arte. A obra é um presente para a terra.”  Ver cópia disponível no Anexo 01.

[13] No Depoimento dado para essa pesquisa a artista afirmou que  a direção do Caism – Centro de Assistência Integral à Saúde da Mulher – a procurou novamente solicitando nesse ano de 2003 que ela apresentasse uma continuação dos relevos da fachada originados nesse primeiro projeto de modo que o quinto e mais recente prédio em andamento pudesse contar com a continuidade dos relevos já existentes de sua fachada.

[14] Algumas exceções devem ser feitas aqui devido à singularidade material e executiva dos projetos de Marco do Vale e Noboru Ohnuma. Nesses dois casos o ESTEC fez participa efetivamente apenas da liberação para a execução dos projetos.

[15] De acordo com o texto depoimento do artista. HOFLING, J. R. Esculturas da Unicamp.[mensagem pessoal] mensagem recebida por < shfdc@uol.com.br> em 27/11/2003

[16] Uma cópia do texto usado por ele bem como a sinopse do vídeo É a questão criado a partir do evento  estão disponíveis no Anexo 02 desta pesquisa.

[17] BASBAUM, Ricardo. Projeto NBP: algumas pistas de um programa em processo. Artigo-performance, 2002 (?) p. 02.

[18] No ofício nº 550/85/IA de 05/08/1985, assinado pelo diretor do Instituto de Artes, prof. Dr. José Antonio de Almeida Prado, encaminhado para o Gabinete do Reitor da Universidade, prof. Dr. José Aristodemo Pinotti, Almeida Prado encaminha nova cópia do ofício 369/85-IA, datado de 05/06/1985, no qual solicitava “a criação de uma comissão para coordenar a seleção e distribuição de obras de arte pelo ‘campus’ da UNICAMP.”  Contudo, a comissão não se efetiva.

[19] Processo de doação de 21/02/1991 iniciado pela empresa importadora de Eduardo Spinelli. Unicamp, Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos – SIARQ.

[20] No ofício de nº 005/92 datado de 06/02/1991 Alvaro de Bautista, prof. Chefe do departamento de Artes Plásticas do IA,  encaminha a avaliação solicitada por Oscar O. Campiglia (responsável pelo setor de Apoio da Administração Geral da Unicamp) sobre a obra de Benetton destacando os elementos plásticos que a obra de Benetton acrescentaria ao campus. Coloca em seu ofício a sugestão de que a obra deve ser instalada em “local apropriado e devidamente iluminado”. O parecer dado por Bautista é resposta à solicitação do prof. Dr. Junqueira Guimarães que ocupava o cargo de Sub Chefe de Gabinete da Universidade, consolidando assim o processo dessa doação através dos contatos estabelecidos entre a Fundação Bienal de SP e as esferas administrativas mais altas da Universidade.    Unicamp, Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos – SIARQ.

[21] Processo de doação 5843/1985. Unicamp, Acervo Histórico do Arquivo Central do Sistema de Arquivos – SIARQ.

[22] É interessante observar que nesse processo de doação a resposta dada pelo Gabinete da Reitoria no documento datado de 23/09/1985 cita-se a seguinte configuração para aprovação e encaminhamento da doação: “1-Considerando não haver cláusula restritiva na presente documentação, entendemos ser dispensável a apreciação pelo conselho diretor, nos termos do regimento geral da universidade.”  Esse procedimento indica que quando o pedido de doação é formalizado por um departamento reconhecido da universidade (diferente portanto do caso da peça de Benetton) dispensa qualquer outra consulta, seja administrativa ou técnica, do departamento de Artes, que presumivelmente seria o mais adequado para intermediar a avaliação e mérito daquela incorporação. Esboçam-se com isso também os indicadores do futuro trajeto da coleção da Universidade.

[23] Dados retirados do depoimento do artista. BRANCO, Osni. Site Specific e imagem original.[mensagem pessoal] Mensagem recebida por <shfdc@uol.com.br> em  15/12/2003.

[24] Ver cópia do regulamento no Anexo 03.

[25] Ver cópia da ata de Seleção no Anexo 04.

[26] MONUMENTO para comemorar os 20 anos da Unicamp. Jornal Correio Popular.  02/06/1983, p.13.

[27] A única exceção a ser feita aqui é sobre a escultura de Simon Benetton que está instalada em área bastante neutra, entre o Restaurante Comunitário e o Prédio da Biblioteca Central juntamente da entrada da Galeria de Arte que funciona no térreo.

[28] Essa atuação foi confirmada em entrevista pelas funcionárias técnicas da Galeria de Arte: Vera Samaniuc e Maria Lucia Alves nas entrevistas concedidas em outubro e novembro de 2003. Contudo, num ofício encaminhado ao prof. Dr. Marcius Freire, diretor do IA, o prof. Nardim então coordenador da Galeria, representado por Vera Semaniuc admite as responsabilidade do Instituto de Artes “sobre as obras doadas à essa universidade.” Solicitando uma ajuda de restauro para a peça Monumento Campinas de Akiko Fujita. Ofício 018/93 datado de 23 de setembro de 1993.

[29] Com a ajuda de textos que estudam a escultura e sua passagem da modernidade para a contemporaneidade desenvolvidos por Rosalind Krauss/ Passagens da Escultura Moderna; Alberto Tassinari/ o Espaço Moderno;  Agnaldo Farias/ Esculpindo o Espaço, dentre outros autores, discuto em minha dissertação de mestrado que:  “Dentro das aberturas das estéticas modernas, o encontro entre objeto artístico e o entorno construído inclui o início de passeios errantes das peças escultóricas por espaços em freqüente transformação devido a uma nova condição urbana. O princípio de independência da escultura moderna diante do seu entorno e a fragmentação do espaço público são os elementos indicadores da mudança radical pela qual vai passar a Arte Pública.  (…) O que se segue é o arrefecimento dessa fórmula de  Arte Pública, na mesma proporção em que padece o elemento fixo que a produziu: o espaço imutável, sagrado, central, determinado como acessível e, portanto, público. Assistimos a um primeiro colapso do espaço urbano. Tomando uma direção que escapa da suposta simples expansão do centro para o subúrbio, o espaço urbano passa a ser determinado pelo aleatório de uma organização estilhaçada, sem o sentido de pertença e organicidade formuladas no passado. Os próprios caminhos estéticos galgados pela Modernidade tornam crítica a constituição da Arte Pública diante da autonomia do objeto artístico e sua baixa correspondência nesse momento com as expectativas comuns da população acerca do modelo do que seja considerado arte.”  In: FUREGATTI, Sylvia. Op. cit, p. 26.

[30] Canclini discute a hibridação sofrida pelos monumentos a partir de sua interação com o crescimento urbano e demais elementos da cultura atual e aponta a impossibilidade de se manter o antigo modelo hierárquico e inflexível da coleção: “ A história da arte e da literatura formou-se com base nas coleções que os museus e as bibliotecas alojavam quando eram edifícios para guardar, exibir e consultar coleções. Hoje os museus de arte expõem Rembrandt e Bacon em uma sala; na seguinte, objetos populares e desenho industrial; mais adiante, ambientações , performances, instalações e arte corporal de artistas que já não acreditam nas obras e se recusam a reproduzir objetos colecionáveis. As bibliotecas públicas continuam existindo de um modo mais tradicional, mas qualquer intelectual ou estudante trabalha muito mais em sua biblioteca privada (…) Também no espaço urbano o conjunto de obras que estruturavam a cultura visual e davam gramática de leitura da cidade, diminuíram sua eficácia. Não há um sistema arquitetônico homogêneo e vão-se perdendo os perfis diferenciais dos bairros. A falta de regulamentação urbanística, a hibridez cultural de construtores e usuários, entremesclam em uma mesma rua estilos de várias épocas. A interação dos monumentos com mensagens publicitárias e políticas situa em redes heteróclitas a organização da memória e da ordem visual. A agonia das coleções é o sintoma mais claro de como se desvanecem as classificações que distinguiam o culto do popular e ambos do massivo. Agora as coleções renovam sua composição e sua hierarquia com as modas, entrecruzam-se o tempo todo, e ainda por cima, cada usuário pode fazer a sua própria coleção.”    CANCLINI, Nestor Garcia. Cultluras Híbridas, pág 303 e 304.

[31] Canclini propõe a seguinte observação sobre a mudança dos modos constitutivos e formatos das coleções: (…) “Efetivamente não há razões para se lamentar a decomposição das coleções rígidas que, ao separar o culto, o popular e o massivo, promoviam as desigualdades. Também não acreditamos que haja perspectivas de restaurar essa ordem clássica da modernidade. Vemos nos cruzamentos irreverentes ocasiões de relativizar os fundamentalismos religiosos, políticos, nacionais, étnicos, artísticos, que absolutizam certos patrimônios e descriminam os demais.” CANCILINI, N. G.  Op. Cit. p.307

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